
Contra a Cumplicidade e a Omissão diante da Política de Extermínio no Amapá.
Diante da operação da Polícia Militar do Estado do Amapá, realizada na madrugada do dia 4 de maio de 2025, que resultou na morte de sete homens no município de Macapá, a Comissão de Direitos Humanos da ANPOCS subscreve a nota “Contra a Cumplicidade e a Omissão diante da Política de Extermínio no Amapá”, elaborada pelo Laboratório de Estudos Etnográficos e Antropologia do Direito (LAET), da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP).
Nos solidarizamos com os/as familiares e amigos/as das vítimas e reivindicamos apurações rigorosas e transparentes, com a devida responsabilização dos envolvidos, caso se confirmem abusos e ilegalidades.
Assinado Comissão de Direitos Humanos/ANPOCS
Nota do Laet/UNIFAP.
“Contra a Cumplicidade e a Omissão diante da Política de Extermínio no Amapá”
Na madrugada do dia 4 de maio de 2025, sete jovens foram mortos durante uma ação da Polícia Militar do Estado do Amapá, no bairro Pantanal, em Macapá. A “versão oficial” aponta para um confronto armado e o suposto envolvimento das vítimas com facções criminosas. No entanto, familiares, amigos e o clube de futebol Bragantino — onde um dos jovens atuava — têm contestado veementemente essa versão, exigindo explicações sobre as circunstâncias da operação.
Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pesquisas do Laboratório de Estudos Etnográficos e Antropologia do Direito (LAET/UNIFAP) mostram que a Polícia Militar do Amapá ocupa, há anos, as primeiras posições nos índices nacionais de letalidade policial, ao mesmo tempo em que apresenta números insignificantes de agentes feridos ou mortos em situações registradas como “confrontos”. Pesquisadoras e pesquisadores do LAET/UNIFAP demonstraram que essa incongruência permite lançar dúvidas razoáveis e fundamentadas sobre a veracidade das “versões oficiais” em alguns casos e sobre a qualidade das investigações em episódios dessa natureza, indicando que execuções sumárias possam estar sendo tratadas como “resposta à injusta agressão”.
Essa realidade se perpetua diante da postura deliberadamente omissa do Ministério Público local. Não podemos naturalizar que jovens continuem sendo mortos, sem que o Estado ofereça respostas adequadas. Somos parte de um país ainda profundamente atravessado por desigualdades raciais, sociais, de gênero, geração e território — e são essas desigualdades que determinam, com assustadora regularidade, quem são as vítimas preferenciais da violência letal e onde elas vivem. No Amapá, essa realidade é escancarada pelos números e pelo silêncio institucional diante de casos recorrentes, como o ocorrido neste fim de semana.
Os membros e membras do LAET/UNIFAP se solidarizam com os familiares e amigos das vítimas, se colocam contra as políticas de extermínio e demandam rigorosas investigações por parte das instituições responsáveis, cuja atuação tem sido sistematicamente conivente com o modus operandi da polícia local. A apuração deve ocorrer com total transparência e garantir a responsabilização dos envolvidos, caso se confirmem abusos ou ilegalidades. A banalização da morte de jovens negros e periféricos não pode mais ser tolerada como subproduto de operações policiais.
Por fim, impõe-se à sociedade civil e aos movimentos organizados a tarefa urgente de romper com a normalização da letalidade estatal, enfrentando com lucidez e determinação as engrenagens de um Estado que opera seletivamente a morte sob o disfarce da ordem.