Por Rogério Barbosa

Publicado originalmente em 29/04/2021

#AbreAspas | Censo ou não Censo? Reviramo-nos com essa questão, depois do abissal corte orçamentário. Planejado para 2020 e adiado para 2021, devido à pandemia; hoje sem data. Verdade seja dita: o desmonte se iniciou em 2019. Precisamente quando Guedes, na cerimônia de posse da presidente do IBGE, declarou que o Censo deveria ser mais barato: mesmo que o questionário tivesse que ser cortado, mesmo que a instituição tivesse que vender seus imóveis. E pontuou: “quem pergunta demais vai descobrir o que não quer”.

Orçado inicialmente em R$ 3,4 bilhões (custo mensal do Bolsa Família), o Censo teve ali sua sentença de austeridade. Havia ordens para não ultrapassar 2,4 bi. Nenhum “prédio” foi vendido: uns poucos milhões não fariam diferença. Mas os cortes no questionário vieram. Por um tempo, a discussão pública se resumiu a isso. Alguns demógrafos, com uma agenda de melhorias metodológicas, endossaram. A intenção era boa, mas o timing péssimo. Deveriam ter falado de orçamento. Os custos são majoritariamente logísticos, o questionário responde por muito pouco. Os “cortes metodológicos” foram oportunísticos e inadvertidamente legitimaram a posição do governo anti-ciência.

Compareci à Comissão Mista de Orçamento, em dezembro de 2019, defendendo a restituição orçamentária. Naquela altura, parecia que algo se encaminharia. Mas sobreveio a Covid. O IBGE alterou sua estratégia de coleta para as pesquisas amostrais: tudo por telefone agora. O mesmo, porém, não é possível para o Censo, que deve chegar inclusive a quem não tem acesso a meios telemáticos. Com o necessário distanciamento social, pessoas recusariam visitas, entrevistadores se contaminariam ou se tornariam vetores. Não respostas e vieses explodiriam. O impacto de mais um adiamento é tremendo, mas não maior que o impacto sobre vidas.

Rótulos de “inimigos” e “amigos” do Censo ocultam nuanças. Lamento muito, mas devo dizer: 2021 não é ano para Censo. Lutemos pela sua realização plena em 2022.

Rogério Barbosa. Professor de Sociologia IESP/UERJ

*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.

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