Por Mylene Mizrahi
Publicado originalmente em 27/07/2021
#AbreAspas | Rebeca Andrade causou comoção nas redes com sua apresentação ao som de Baile de Favela no último domingo em Tóquio. Celebrou-se a representatividade da mulher negra e a diversidade da cultura da favela. Notou-se ainda que o funk de eletrônico passou a sinfônico, recurso que, se atenuaria seu caráter periférico, deve ser pensado em continuidade com a prática dos MCs de funk de alterar as letras de suas produções para ter a entrada em espaços hegemônicos franqueada. O funk sempre negocia para potencializar sua circulação. E se a sonoridade orquestrada confunde, logo adiante escutamos o beat box, estilizado, é verdade, mas que ainda assim não deixa dúvidas: é funk e bota a gente pra dançar.
Rebeca não está inventando do nada e elabora em continuidade com a tradição inaugurada por Daiane dos Santos que, com Brasileirinho, carregava brasilidade para os espaços globais nos quais se apresentava. Mas se Daiane, sempre negociando, escolheu como sua marca o mui palatável chorinho, Rebeca escolheu não apenas o funk e fez uma ode não apenas à favela, mas ao baile da favela, como não deixa engano a letra explícita da composição de MC João.
Rebeca parece se inspirar também no movimento negro norte-americano, como nas performances de Nia Dennis, a ginasta da UCLA que eletriza o público com apresentações ao som de Beyoncé, ícone pop das reivindicações de negritude contemporâneas.
Devemos mesmo celebrar termos chegado ao ponto em que uma estrela negra brasileira se autoriza a fazer da música de favela sua marca. Rebeca enaltece a criatividade da periferia e fala não somente para o mundo, mas para que o Brasil se ouça e se reconheça. Funk bom, baile bom, é na favela. E não porque a população favelada não tenha alternativa de diversão, mas porque a periferia é pura potência criativa.
Mylene Mizrahi. PUC-Rio / Coordenadora do Estetipop – laboratório de pesquisa em estéticas, antropologia e cultura pop/popular.
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.