Por Gabriel Feltran
Publicado originalmente em 24/08/2021
#AbreAspas | A ascensão de Bolsonaro não representa uma alternância de poder, mas um projeto de mudança de regime. O que é fundamental à democracia – divisão de poderes, liberdade de imprensa e cátedra, eleições livres, controle público sobre as polícias e as armas – é obstáculo a superar na “𝐫𝐞𝐯𝐨𝐥𝐮çã𝐨” bolsonarista.
Frações politizadas das polícias são o núcleo duro desse movimento. Policiais tripudiam abertamente do STF, do Congresso, de governadores, cientistas e jornalistas. Espelham-se em outros policiais que, fardados, fizeram e fazem campanha eleitoral. Entre 2014 e 2018, dados do TSE mostram que quintuplicou o número de policiais militares eleitos para o Congresso Nacional. Estados e municípios vão na mesma balada.
Em 2021, o movimento político nas polícias está bem instalado em diferentes partidos e, junto de seus pares, teve recursos para compor maioria – instável, é verdade – na Câmara e no Senado. As polícias têm hoje influência política entre juízes e nos Ministérios Públicos. Dessas posições de poder, esses homens de bem têm acesso a muitos fundos públicos que fortalecem seu projeto político. Alcançar as instituições é um meio para a transformação social almejada: uma pátria cristã e livre de bandidos (categoria que, claro, inclui a oposição).
Apenas um meio, pois o fim é 𝐝𝐞𝐟𝐞𝐧𝐝𝐞𝐫 𝐚 𝐬𝐨𝐜𝐢𝐞𝐝𝐚𝐝𝐞. Limpá-la dos bandidos, corruptos, depravados. O movimento político das polícias é hoje baseado no acesso a: i) ideologias totalitárias ii) fundos públicos bilionários e iii) armas de fogo. Seria essa composição capaz de fundar outro regime político? As eleições de 2022 serão a resposta, se a ruptura institucional protagonizada pelas polícias militares puder ser evitada.
Gabriel Feltran. Professor do departamento de sociologia da UFSCAR (@ufscaroficial) e pesquisador do Núcleo de Etnografias Urbanas do Cebrap (@cebrap50)
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.