Raquel Oliveira, Andréa Zhouri, Ana Flávia Santos

Publicado originalmente em 25/01/2022

#AbreAspas | Moradores das localidades mineiras próximas das barragens de rejeito vivenciam o medo, a insegurança e o desamparo. A Agência Nacional de Mineração aponta 31 barragens em estado de emergência em Minas Gerais, pelo menos três com risco iminente de rompimento. As intensas chuvas de janeiro agravaram os processos erosivos nas estruturas, testando a capacidade dos dispositivos de drenagem e monitoramento. Entretanto, o discurso que acentua o papel das ocorrências climáticas singulares oblitera o conjunto de processos sociopolíticos capazes de transformar tais eventos em desastres.

Nas paragens das “montanhas pulverizadas” de Drummond, quase 65% dos projetos considerados prioritários pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente são relativos à mineração. Instrumentos de flexibilização, como as licenças simplificadas ou concomitantes, hoje debatidos no âmbito da Nova Lei Geral de Licenciamento Ambiental, operam no estado desde 2017. Em Minas, a escalada das licenças mobiliza uma concertação entre agentes privados e públicos essencial à viabilização dos projetos. Uma auditoria feita pela Controladoria Geral do Estado, relativa à apreciação de licenças pela Câmara de Atividades Minerárias em 2019 apontou fortes correlações entre votos dos representantes do Governo do Estado e do Setor Produtivo-Minerário.

Completam esse cenário as condições precarizadas dos órgãos de controle e fiscalização e a aposta na autorregulação corporativa. O Relatório do Senado Federal sobre a CPI de Brumadinho indicou a existência de diversos vícios nessa dinâmica, como interferências impróprias dos contratantes sobre os auditores, permissividade quanto aos laudos, além de conflitos de interesses decorrentes da assinatura de múltiplos contratos com uma mesma auditora.

Longe da imagem das condições climáticas extremas ou das imperícias excepcionais, a produção das catástrofes revela a face cotidiana e não espetacular do desmonte ambiental que se materializa na vulnerabilização dos territórios

Raquel Oliveira, Andréa Zhouri e Ana Flávia Santos. GESTA – UFMG (@ufmg)

*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.

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