Por Manuela Cordeiro
Publicado originalmente em 17/01/2022
#AbreAspas | Os olhos da menina que o via, todo de branco, ali próximo, mas tão imponente ao dizer sua poesia. Dizer mesmo, declamar é descabido. Disse-me que se deve levar poesia a sério, mesmo quando a vida não permitir. Aprendi, em um jantar com ele, olhando diretamente para mim, que os meus pais eram falíveis. São duas coisas que nunca esqueci.
Nascido em Barreirinhas, Amazonas, representante do norte real, filho da floresta. Cantor do amor e liberdade, com a eloquencia da mata e a potência da resistência. Como bem disse Milton Hatoum, seu conterrâneo, a natureza e a política são afluentes do mesmo rio em sua produção. Um dos primeiros poetas a defender os povos originários.
“Quem mata a floresta, mata a casa da vida” citando um indígena Yanomami. “Curandeiro” de sua própria aldeia, era procurado para cuidar das pessoas, tendo cursado alguns anos de Medicina. Cuidava por meio do compromisso com a verdade e ética também. Metáfora e ação. Fica decretado que “Estatutos do Homem” e “Faz escuro mas eu canto” têm direito a converter-se em vida.
No último dia quatorze, dizemos adeus ao companheiro. Em um momento bem escuro, porém que nos lembra a necessidade de insistir em cantar.
Poeta, que sejamos capazes, como um rio,
Mesmo com a canoa cansada,
Cumprir, no nosso curso, a esperança.
Manuela Cordeiro (@cordeiro.s.manuela). Professora do curso de bacharelado em antropologia e da pós-graduação em antropologia social (PPGANTS) da Universidade Federal de Roraima (@ufrroficial)
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.