Por Aparecida Vilaça

Publicado originalmente em 20/06/2022

#AbreAspas | Bruno e Dom são agora chamados de heróis nas redes sociais, ao lado de outros dois ambientalistas também brutalmente assassinados: Dorothy Stang e Chico Mendes. Evidentemente o são, mas porque somente depois de mortos? O que explica o completo desconhecimento da quase totalidade de nossa sociedade da atuação, coragem e dedicação dessas pessoas enquanto vivas? Por que não se fala mais, nos jornais, TV e redes sociais, desses homens e mulheres que, com uma coragem inimaginável, estão lutando, em parceria com os indígenas e outras minorias, por suas terras e direitos há anos a fio? O que explica esse silêncio a não ser um pacto implícito com a destruição em curso?

Penso que cabe a nós, cientistas sociais, e aos antropólogos em particular, não somente denunciar o que vem ocorrendo no Brasil, e em particular na Amazônia, onde um verdadeiro extermínio está em curso, mas também nos esforçarmos para atingir o público leigo com nosso conhecimento sobre a importância dos povos e grupos minoritários de todos os tipos para a vitalidade de nossa sociedade como um todo, chamar a atenção para a beleza dessas culturas, de todas elas, e para o quanto podem nos ensinar a sermos pessoas melhores, mais abertas, tolerantes e curiosas, capazes, dentre outras coisas, de respeitar o meio ambiente e seus importantes guardiães.

O que fizeram com Bruno e Dom, e antes com Chico Mendes, Dorothy Stang e tantos outros, pode acontecer com qualquer um de nós se esse governo assassino se perpetuar. Sabemos que, diante dos descalabros que vêm se passando, com os invasores, mineradores e narcotraficantes sentindo-se donos da Amazônia com o aval do presidente, não somente os indígenas, mas todos os que trabalham junto a eles tornaram-se alvo.

A questão, entretanto, é muito mais ampla e diz respeito a todos. Se nós, antropólogos, indigenistas e ambientalistas, vemo-nos tão facilmente na posição de nossos amigos assassinados, todos nós, cidadãs e cidadãos, que andamos por aí pensando estarmos seguros quando denunciamos maus tratos e outras atitudes moralmente insustentáveis que hoje vivenciamos cotidianamente nas ruas, tornamo-nos igualmente alvos. Bruno, Dom, Chico e Dorothy somos nós amanhã, caso não atuemos rapidamente para tirar do anonimato essas vidas que, até ontem ou anteontem, dedicavam-se ao nosso bem estar comum.

Aparecida Vilaça. PPGAS-Museu Nacional – UFRJ (@ufrj.oficial)

A ANPOCS convida especialistas para se pronunciarem em seu nome sobre o bárbaro assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips.

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