Por Guilherme Henrique Soares
Publicado originalmente em 11/08/2022
#OcupaANPOCS | A recente arqueologia da Amazônia, aliada à Ecologia Histórica, têm contribuído para a crítica da Grande Narrativa que retrata a domesticação como o ato civilizacional por excelência. A partir da noção de florestas antropogênicas, percebemos na Amazônia uma realidade em que a combinação de práticas de horticultura e agrofloresta revelam manejo sem cultivo, cultivo sem domesticação e domesticação sem agricultura.
Contudo, a ideia de domesticação atravessa o debate sem ser questionada. Se considerarmos, de um lado, as etnografias produzidas na Amazônia que tratam da relação dos grupos com os vegetais, que apresentam a floresta como povoada de sujeitos, em que cada espaço é, potencialmente, a casa ou o cultivo de alguém; e de outro a dimensão hierárquica do conceito, uma vez que seu ponto central é o grau de controle da reprodução exercido sobre certa espécie, constatamos que se trata de um dispositivo que dá conta apenas da perspectiva humana sobre o processo, mesmo quando usado como sinônimo de coevolução.
A complexidade nas relações envolvidas entre humanos, plantas, animais, solos, bactérias, fungos, regimes hidrológicos e fenômenos atmosféricos, operando em ritmos e temporalidades as vezes díspares e outras vezes coordenadas, mas que se interpenetram, sobrecarregariam os modelos científicos se estudadas em todas as suas particularidades, uma vez que estes só podem fornecer descrições desses processos tal como ocorrem a nível
genérico, ou detalhando apenas uma pequena parte dessa imensa rede, deslocando-a do seu contexto de interações. Mas e se buscarmos entender as práticas e relacionamentos envolvidos nesta rica malha ecológica a partir de outras matrizes de pensamento e formas de conhecer, levando em conta jogos de perspectiva situadas em diferentes níveis e escalas?
Imagem: Jaider Esbell, PIPA Prize. – “A conversa das entidades integalácticas para decidir o futuro universal da humanidade”, 2021, Acrílica e posca sobre tela, 112 x 232 cm
Guilherme Henriques Soares. Doutorando no PPGAS/UFAM e pesquisador do NEAI
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.