Por Renata Mourão Macedo
Publicado originalmente em 02/08/2022
#AbreAspas | Não bastassem sucessivos cortes de verbas e declarações contra os direitos humanos. Não bastassem denúncias de corrupção que apontam que o MEC foi transformado em um balcão de negócios de pastores apadrinhados pelo ex-ministro Milton Ribeiro. Não bastassem cinco ministros em menos de quatro anos, descompassados das exigências do cargo. Como se não bastasse, sob o governo Bolsonaro, profissionais da educação e da ciência foram convertidos em “inimigos”. A ideia de crise talvez nem seja adequada: o desmonte tem sido constante e sistemático, agindo em várias frentes.
Se o início do governo foi marcado pelo desnorteio de políticas educacionais e pelo agravamento de desigualdades, a inépcia dessa gestão durante a pandemia acentuou o problema. No ensino básico, a evasão escolar cresceu enquanto os investimentos diminuíram. No ensino superior público, a desvalorização sistemática da ciência, aliada a sucessivos cortes em bolsas e no orçamento, afetaram as condições de continuidade do sistema. Já no ensino superior privado, a precarização do trabalho docente, liderada por grupos empresariais que possuem compromisso com o lucro, segue seu curso, incentivada pelo governo. O atual ministro Victor Godoy, seguindo a mesma toada de seus antecessores, tem acobertado os escândalos de corrupção do MEC, bloqueado mais verbas (apenas em julho de 2022, foram anunciados cortes de 6,7 bilhões, a atingir Educação e Saúde) e defendido no Twitter o alinhamento à “agenda conservadora” internacional.
“Já se disse que não existe Estado democrático sem educação democrática”, lembrou Florestan Fernandes em 1988, citando Anísio Teixeira. No contexto atual, marcado pela implementação da deseducação, tais palavras devem ser relembradas. Diante de tamanho descalabro, além da indignação, cumpre reunirmos forças para a reconstrução crítica das políticas educacionais brasileiras no futuro próximo.
Renata Mourão Macedo (@renatagmm). Cientista social, professora da FESPSP (@FESPSP) e na FCMSCSP
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.