Por Luciana Villas Bôas

Publicado originalmente em 04/11/2022

#Eleições2022 | Talvez o traço mais notável do tão aguardado pronunciamento de Bolsonaro, dois dias após as eleições, seja a absoluta falta de novidade. Como era de se esperar, não demonstrou nenhum constrangimento em não reconhecer o resultado do pleito e, portanto, a própria derrota. O silêncio vociferante do presidente tinha um sentido claro: desconcertar o princípio da alternância do poder e o seu pressuposto, a transmissão pacífica do cargo. Ajudou a conjurar, mais uma vez, a ameaça de ruptura, de encenar a invasão do Capitólio em Brasília – a PM do DF chegou a isolar a Esplanada dos Ministérios e a Praça dos Três Poderes para evitar o ataque anunciado.

Quando decidiu falar, visivelmente contrariado, depois de deixar a imprensa esperando, repetiu o velho truque de adotar uma posição ambivalente, agora, em relação ao resultado do pleito e às manifestações de seus apoiadores. Enquanto legitimava os protestos – que seriam “fruto da indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral” – colocava em xeque as eleições e regava a semente para contestações futuras do resultado. Enquanto pedia aos manifestantes que não interrompessem as estradas e abdicassem de métodos usados pela esquerda, dividia a sociedade entre esquerda e direita, entoando o seu discurso de facção.

Não satisfeito, declarou-se honrado de “ser o líder de milhões de brasileiros que defendem a liberdade econômica, a liberdade religiosa, a liberdade opinião, a honestidade e as cores (…) da nossa bandeira.” Dirigia-se, embora a disputa eleitoral tenha acabado, e ainda seja ele o ocupante do cargo de presidente, apenas aos seus eleitores, à sua comunidade de valores. Ora, foi exatamente assim que Bolsonaro atuou no poder, recusando-se a governar para todos, recusando-se a desempenhar o papel que lhe delegado.

Luciana Villas Bôas. UFRJ

*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.

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