Por Jacqueline Gomes de Jesus
Publicado originalmente em 13/03/2023
#AbreAspas | O deputado Nikolas Ferreira já é investigado por expor uma adolescente em redes sociais e por transfobia contra a também deputada federal Duda Salabert. A diferença deste novo episódio com relação aos recorrentes nas décadas de atuação do ex-presidente Bolsonaro foi amplo repúdio e abertura de queixas-crime por transfobia, parte de reações à ofensiva neoconservadora anti-gênero e de avanços democráticos, como o reconhecimento do direito das pessoas trans à auto-determinação de sua identidade de gênero e a criminalização da homofobia e da transfobia pelo Supremo Tribunal Federal.
O imaginário social estereotipado que reduz mulheres trans e travestis ao ato de “vestir-se de mulher” remonta à denominação “transvestire” da Itália do século XVI; ao julgamento pela Inquisição, em 1591, de Xica Manicongo, natural do Congo e escravizada em Salvador, acusada de sodomia porque “recusava-se trazer vestido de homem que lhe dava seu senhor”; à utilização, na Inglaterra do século XVIII, do termo “travesty of justice”, sinônimo transfóbico de disfarce mal intencionado quando se fala que alguém “travestiu-se” ou é “travestido”.
Com uma peruca mal-ajambrada, o parlamentar não defendeu mulheres cis (que se identificam com o gênero que lhes foi atribuído ao nascimento) no plenário da Câmara dos Deputados ao falar que perdem “espaço para homens que se sentem mulheres”. Ele tirou foco do inimigo concreto de todas as mulheres: o machismo que autoriza ataques à autonomia e liberdade femininas, a masculinidade tóxica e frágil que corrobora dominação masculina, feminicídio e transfobia no país com o maior número absoluto de assassinatos de mulheres trans e travestis e a maior porcentagem de buscas na internet por pornografia trans. Não é paradoxo, é um mesmo sistema de objetificação e ameaça contra feminilidades insubmissas.
Jaqueline Gomes de Jesus (@instadajaqueline). IFRJ e ABETH
—
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.