Por Gilberto Hochman

Publicado originalmente em 08/02/2021.

Quando e como uma epidemia termina? Quem atesta o seu desaparecimento? Com quais critérios? O que significa esse fim? Dado o caráter trágico e disruptivo da pandemia de Covid-19, muitos perguntam sobre seu início (“o caso zero”), suas origens (“a nacionalidade do vírus”), e sua intensidade (“ondas”, “picos”, “platôs”). Com o começo da vacinação, as novas perguntas versam sobre o seu declínio, controle ou eliminação (da transmissão e de óbitos) ou o alcance da “imunidade coletiva”. E as respostas não são exclusivas da epidemiologia ou da biomedicina. O término da pandemia pode resultar de uma vacina acessível ou/e terapêutica eficaz mas, também, da forma como diferentes grupos a percebem e a experimentam no presente (por ex. a adesão/hesitação às ofertas preventivas e terapêuticas), como compreendem e imaginam que a vida social, por ela interrompida, será reestabelecida e pelos interesses políticos e econômicos envolvidos na sua reprodução/eliminação. A negação da pandemia pelo governo é um obstáculo para um epílogo (social/biológico) da crise sanitária.

Esse ansiado fim resultará da (in)ação e do entendimento de múltiplos atores: governos, organizações internacionais, políticos, cientistas, epidemiologistas, imunologistas, profissionais de saúde, imprensa e redes sociais, sociedades científicas, empresas e organizações da sociedade civil. O desaparecimento de uma epidemia é, sempre, instável no curto prazo, mas produz resultados concretos na vida social. A vacinação é etapa crucial e necessária porém uma pandemia não termina, de modo igual e ao mesmo tempo, para diferentes grupos sociais e espaços. Lembremos da pólio e da Zika. Os efeitos da Covid-19, exponenciados pela desigualdade social, racial e de gênero e agravados pela inépcia governamental, permanecerão nos corpos, no cotidiano e nas memórias de parte expressiva da sociedade brasileira.

Gilberto Hochman (gilberto_hochman). Pesquisador da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz.

*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.

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