Por Jess Reia
Publicado originalmente em 10/02/2021.
Artistas de rua, com sua presença perene em cidades ao redor do mundo, ocupam lugares afetivos e políticos nos espaços públicos. Artistas que se apresentam nas ruas podem nos ensinar sobre relações de poder, direito à cidade, violência policial e políticas culturais (ou a ausência delas). Em fevereiro de 2021, o assassinato de um artista de rua no Chile ganhou as manchetes internacionais. Policiais atiraram em Francisco Martínez à luz do dia, no centro de Panguipulli.
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A brutalidade e arbitrariedade da polícia chilena, já tão questionada, chocou a população local e levou a protestos que culminaram em prédios públicos em chamas. Meses antes, em novembro de 2020, seguranças do metrô do Rio de Janeiro retiraram violentamente (mais) um músico de dentro do vagão, diante da indignação dos passageiros. Se não fosse pela ajuda de transeuntes, o músico não sabe dizer o desfecho que a situação teria.
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Existem muitos casos similares. O lugar da arte de rua – que no caso da música apresenta desafios acústicos e logísticos – é contestado há séculos. Da Londres vitoriana à São Paulo contemporânea, a estigmatização persiste. Achar que música de rua é arte menos qualificada esvazia sua importância. Abordagens higienistas e excludentes de (des)ordem pública reproduzem desigualdades no acesso à espaços e cultura.
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Música de rua é prática complexa, cheia de nuances. Olhando além do enquadramento regulatório, trata-se de forma não institucionalizada de expressão artística, disponível ao grande público, nos caminhos, realizada através de trocas. Artistas oferecem entretenimento e a audiência, financiamento da arte no chapéu. A pandemia afetou esses artistas: as ruas vazias não são mais palcos efêmeros. Músicos passam a se apresentar online, fazer bicos, aguardando o momento do retorno seguro. A Lei Aldir Blanc, tão necessária, nem sempre contempla as múltiplas existências da arte de rua no Brasil. Qual será o lugar que daremos à ela na vida pós-pandemia?
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Jess Reia (@jhereia). Pesquisadorx da McGill University.
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.