Por Eugênia Motta
Publicado originalmente em 15/02/2021.
O auxílio emergencial foi a maior ação pública de combate aos impactos da pandemia de Covid-19 no Brasil. O dinheiro que circula a partir dele é atravessado por moralidades desde sua origem como proposta, até os usos pelos “beneficiários”.
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Em todas as escalas há concepções sobre o que é gastar bem. É em torno delas que se dão debates e escolhas. Na direção oposta à defesa do controle fiscal e da austeridade predominantes nas políticas econômicas mundialmente até pouco tempo, essa política se somou a inúmeras ações colocadas em prática em dezenas de países e justificadas pela dimensão da crise atual.
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Os gastos estatais deixaram de ser considerados como ameaça ao futuro e passaram a ser vistos como a única forma de se garantir algum futuro. No Brasil, se reanimou o debate sobre políticas de transferência de renda. Defensores argumentam que elas garantem condições dignas para os que recebem e, ao mesmo tempo, movem a economia pelo consumo.
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Os que são contrários acham que o caminho do dinheiro estatal deve ser outro: os “estímulos” aos mercados seriam capazes de gerar ganhos distribuídos de forma mais justa. A questão é qual a melhor forma de gastar e, especialmente, com quem.
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Por seu lado, as pessoas que receberam o auxílio explicam como usaram o dinheiro
expressando seus próprios valores. Guardar, gastar com comida ou investir em um negócio são escolhas justificadas pela manutenção da casa e da família e a garantia de seus futuros. O dinheiro vindo do governo em forma de ajuda é percebido como afim a esses objetivos e legitimam o seu recebimento.
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Compreender os valores morais em jogo na economia e como se expressam em
termos práticos permite compreender as políticas públicas de maneira mais complexa e global e, quem sabe possa contribuir para melhores debates e ações no futuro.
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Eugênia Motta é antropóloga, professora e pós-doutoranda no Programa de Pós-graduação em Sociologia do Iesp/Uerj.
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*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.