Por Rodrigo Zeferino

Publicado originalmente em 06/12/2021

#ANPOCSVisual | “Uma rua começa em Itabira e vai dar em qualquer ponto da Terra.” O verso do poema América, de Drummond (1945), expressa o sentimento do poeta em perceber, à sua época, como sua cidadezinha encravada numa pedra, submersa no mar de morros do interior mineiro, tornou-se de súbito alvo do interesse econômico de nações imperialistas.

Mais de 70 anos depois, o Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais – cuja origem remonta àquela pedra itabirana, o exterminado pico do Cauê – figura ainda como responsável por cerca de 50% da produção de minério de ferro no Brasil. A maior parte dessa riqueza gerada em forma de commodity é escoada pela Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM) até o litoral e o produto é exportado a preços baixos sem que haja o devido retorno socioeconômico para as regiões degradadas.

No Norte do Brasil, um outro complexo de jazidas, outra ferrovia e a mesma concessionária – a Vale – reproduzem um cenário análogo. Iniciada na década de 1970, a mineração no Pará conduz à construção da Estrada de Ferro Carajás (EFC).

O projeto Terra em Trânsito propõe a investigação de trechos dessas linhas com vistas à produção de um ensaio fotográfico. Nesses percursos, seguirei o caminho do “trem maior do mundo” – nas palavras de Drummond – que transportam as “montanhas pulverizadas de Minas” (ou do Pará) até o mar.

Às margens das ferrovias encontram-se dezenas de comunidades classificadas com um IDH abaixo da média estabelecida pela ONU. Nesses lugares, vou abordar imageticamente a relação dos moradores com a sensação de ver tal volume de riqueza passar diante de seus olhos, deixando para trás marcas profundas em suas terras.

Acredito que as imagens resultantes deste processo tenham potencial para revelar o paradoxo que justapõe fortuna e carência, ambas em paralelo, na longitude deste caminho sinuoso que o minério é posto a percorrer.

Texto e fotos: Rodrigo Zeferino – @rodzefer (Ipatinga-MG, 1979) é artista visual da fotografia.

*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.

Deixe um comentário