Por Brume Dezembro Iazzetti
Publicado originalmente em 08/02/2022
#AbreAspas | Em “I míssil”, Linn da Quebrada canta sobre sua relação com o mercado e de seu corpo com a indústria. O “míssil” é tanto um sentimento de falta quanto uma vontade por destruição. É uma necessidade que é potência, que vitaliza, mas também adoece – é uma corda bamba daquilo que se é, e do que se pode ser.
O “míssil”, diria, atravessa o dilema da “representação” – da figura que personifica e corporifica, que deve “tornar presente” uma pluralidade de corpos e subjetividades, mas que, também nesse lugar, consegue “tornar presente” de outro modo, abrindo uma brecha em imaginários e quebrando repetições históricas.
Sua entrada atravessa um percurso de onze anos desde que Ariadna esteve no BBB, nos avanços nos modos como pessoas trans tem ocupado novos espaços e conquistado direitos sociais e políticos, assim como tem atravessado novos desafios e perigos.
A presença de Lina no BBB existe na tensão de um corpo marcado pelo lugar da hipersexualidade, do escracho e da criminalidade. De um corpo que tende a ser mais falado sobre do que de fato visto e convivido em sua complexidade. Assim, ter ali uma travesti – e que assim se afirma – acompanha também uma possibilidade de humanização. De Lina se mostrar em suas divagações e sensações – não “apesar de”, mas, justamente, por ser travesti.
Lina, em duas semanas de programa, já vivenciou situações transfóbicas e relatou o cansaço de novamente “re-presentar” – das exaustivas explicações e correções, numa dita “visibilidade” que é solitária e exaustiva. Mas Lina também tem se afetado e se permitido afetar – se atirando ali como o “míssil” de sua música, que vive intensamente entre potências e perigos, existindo nas contradições que deseja habitar e destruir.
Brume Dezembro Iazzetti. Antropóloga, mestranda em história pública (HIPS) e discente no PAGU/Unicamp
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.