Por João Paulo Lima Barreto (Tukano)
Publicado originalmente em 05/06/2023
#MarcoTemporalNão | O racismo como ideologia de uma camada da sociedade é implementada por meio de suas instituições educacionais, e sobretudo na produção de narrativas perversas, que impõem seu modelo de sociedade, de pensamento, de política, de economia como universal e ideal em relação aos outros modelos de sociedades, de pensamentos e conhecimentos.
A invenção do tal Marco Temporal, que querem transformar em Lei, é a manifestação mais explicita do racismo institucional. A Câmara dos Deputados declara explicitamente que o Brasil é racista, um país incapaz de promover o diálogo em suas diferenças, e que escolhe assumir conscientemente o racismo e a discriminação aos povos indígenas com a narrativa do marco temporal para justificar a concepção de que a terra, a floresta e a água são recursos para gerar riquezas.
Diferentemente destes, os povos indígenas consideram a terra, a floresta, a água, e os humanos que nela habitam, como territórios, que o domínio aquático e a terra/floresta são espaços e residências onde habitam outros humanos. Estes são “humanos” (não são “espíritos”), com os quais nós também interagimos, nos comunicamos e aprendemos. Dessa maneira, o território para nós é considerado um lugar de todos, um espaço de convivência regida por regras de respeito, de interação e comunicação para a manutenção do equilíbrio social, político e econômico como um todo.
Os povos indígenas, cuja presença na América tropical data de mais de 12 mil anos, foram responsáveis pelo desenvolvimento de saberes sofisticados no que diz respeito sobretudo ao manejo da floresta, da terra e das águas, que agora são colocados em questão por um parlamento mesquinho sob o que ele próprio define como Marco Temporal de ocupação anciã do Brasil – um véu que tenta esconder uma moral racista sob o verniz civilizatório de alguns pequenos homens públicos deste país. Que vergonha!
João Paulo Lima Barreto (Tukano). Pesquisador do NEAI/UFAM
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.