Por André D. Guedes
Publicado originalmente em 06/05/2021
#ANPOCSComPipoca | Nomadland nos mostra a vida “nomâde” de milhares de americanos que, em seus trailers e vans, circulam e arrumam empregos ocasionais pelas estradas do país.
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Tendo seu ponto de partida numa localidade despovoada pelo fim das atividades de uma mineradora, a princípio o foco do filme parece residir numa crítica ao que vem produzindo o capitalismo americano do início do século XXI: a terra arrasada pelo extrativismo mineral; as histórias de idosos e doentes sem direito a benefícios sociais; as condições de trabalho num centro de distribuição de uma empresa como a Amazon; a crise financeira e imobiliária de 2008, levando tantos a perder suas casas e a fazer de seus veículos um lar.
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Mas Nomadland não se limita a denunciar esse quadro. Pois no filme esse cenário “econômico” contextualiza – e é contextualizado por – um conjunto heteróclito de práticas, narrativas e instituições articulado pela estrada, símbolo e infraestrutura central na vida de tantos nos EUA. O filme cartografa assim a multiplicidade de significados e relações mobilizados pela vida on the road: nas trocas de saberes dos trabalhadores volantes; no colonialismo, tantas vezes genocida, dos pioneiros; na transgressão – que às vezes flerta com o trumpismo – de hobos, hippies e roqueiros; no amor à vida ao ar livre; nas andanças como meio de marcar a (in)dependência perante a família, a casa, as origens; na cultura automobilística de motoqueiros e caminhoneiros.
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Fazendo justiça ao que há de ambivalente na vida dessas pessoas, o filme não reduz suas estórias aos condicionantes das estruturas econômicas, nem à reprodução de certas tradições, nem às consequências de dramas familiares – mas se propõe a descortinar as imbricações entre tudo isso, e entre tantas dessas vidas.
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Foto: Peça do filme “Nomadland”, de Chloé Zhao, distribuído por Searchlight Pictures.
André D. Guedes (@andredumansguedes). Professor do Departamento de Sociologia e do PPGS/UFF (@uffoficial).
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*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.