Por Michel Gherman
Publicado originalmente em 17/10/2023
#AbreAspas | Fui convidado a escrever este pequeno artigo logo após o massacre perpetrado por membros do Hamas no dia 7 de outubro de 2023. As notícias que nos chegavam então eram as piores possíveis. Terroristas matavam (quase) indiscriminadamente, homens, mulheres, crianças e principalmente idosos.
Centenas de jovens em uma festa de música eletrônica foram assassinados, crianças em comunidades agrícolas foram sequestradas, idosos e idosas mortos e levados para o interior da Faixa de Gaza. Enquanto eu contava, dentre os mortos e sequestrados, amigos, filhos de amigos e gente conhecida, aguardava as próximas fases dessa que seria, avaliava eu, das guerras mais sangrentas da região. Bombardeios e invasão de Gaza por Israel viriam e, eu imaginava, seriam recheados com raiva e ressentimento nunca experimentados pelo lado Israelense.
Pois, uma semana depois eles vieram. Estamos no âmago dos acontecimentos. Expostos a cenas dilaceradoras, vemos os milhares de mortos de um lado e de outro. Imaginamos a dor dos sequestrados e de feridos. Vemos uma guerra que mata e fere, acima de tudo, civis. Tanto Palestinos, como israelenses.
Mas gostaria de tratar aqui de uma chave para analisarmos os dias de barbárie que vivemos. Queria analisar a guerra a partir das camadas de temporalidade que ela nos traz.
As relações de Hamas com Nethanyahu se comparam a uma dança macabra. Um simulacro da política. Contidas sob o desejo de destruição e extermínios do outro. Supostos diálogos interrompidos por bombardeios. Uma dança macabra.
O que aconteceu dia 7 de outubro e desde então é uma ruptura com esse simulacro da política, a ruptura com a política. Estamos na temporalidade do ódio, da destruição e do fundamentalismo. O fim é a morte e o extermínio. Não é casual que as datas do conflito apontem para essa nova temporalidade.
50 anos da Guerra de Yom kupur, outro feriado religioso, discursos abertos defendendo o extermínio e a destruição. Shoá e nazismo em sinais trocados e se trocando.
A solução ao fundamentalismo da destruição é a volta da política, sem simulacros e sem temporalidades suicidas- homicidárias. A percepção, assim, do outro em sua alteridade e não enquanto ameaça. A vitória das forças que se enfrentam hoje será a derrota do humanismo como visão de mundo. A vitória tem que ser da negociação e da política. Em Israel, na Palestina e em seus ecos assustadores que ressoam no Brasil.
Michel Gherman. Departamento de sociologia e do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Judaicos e do
Programa de Pós-Graduação em História Social (PPGHIS)
da UFRJ
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.