Por Danilo Araújo Marques
Publicado originalmente em 12/09/2023
#AbreAspas | As comemorações ocorridas no último Sete de Setembro em Brasília foram marcadas pela retomada de uma protocolar normalidade. E, em se tratando de funcionalidade democrática, este é um sinal que merece todo o destaque. Afinal, nos últimos anos, o Dia da Pátria foi utilizado, sem a menor cerimônia, como palanque para a incitação das mais desabridas tentativas de golpe.
Basta lembrar do ataque à mais alta corte de justiça do país em 2021 ou das comemorações, no ano seguinte, pelos 200 anos da Independência do Brasil – que seguiram o decoro de uma micareta verde-amarela na Esplanada dos Ministérios e atingiram o ápice no coro repetitivo de um neologismo paroxítono, esdrúxulo e impronunciável.
Ocorre que, para além do esforço de retomada da regularidade democrática, a solenidade do último Dia da Independência também colocou em cena a disputa pelo resgate de símbolos nacionais. Desde o lema “Democracia, Soberania e União” estampado sob as cores da bandeira até a cena em que um general pede permissão ao presidente da República para iniciar o desfile cívico – numa inversão semiótica do malfadado “Eu autorizo” –, não faltaram sinais de transmissão da mensagem: consolidação da união institucional na presença de representantes dos três poderes, exaltação do SUS na figura do Zé Gotinha, defesa soberana da floresta amazônica pelas Forças Armadas e pelos povos originários, representados por militares indígenas que saudaram a Independência do Brasil e a Amazônia em seus idiomas nativos.
Este foi apenas o primeiro Sete de Setembro após um longo período de degradação e confisco dos símbolos nacionais. Trata-se do início de um complexo processo de reparação do imaginário. E, como este é um elemento fundamental na argamassa que sustenta a comunidade imaginada chamada nação, é esperado que o procedimento não seja tão ágil quanto a reforma dos prédios públicos após o Oito de Janeiro.
Danilo Araujo Marques. Historiador e pesquisador do Projeto República UFMG (@projetorepublicaufmg)
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.