Por Antônio Sérgio Alfredo Guimarães
Publicado originalmente em 01/02/2022
#AbreAspas | Como entenderiam o racismo reverso os que negam a existência do racismo enquanto estrutura? Esses querem evitar a dicotomia entre ação humana e estrutura social, argumentando que essa última resulta justamente de um certo padrão de interação social, que pode ser sempre modificado pelo jogo estratégico dos agentes. Para eles, a distinção entre preconceito, discriminação e racismo não é importante para a argumentação.
Examinando o preconceito racial, Herbert Blumer, em 1958, nos EUA, interpretou-o como um sentido de posição social. Aversões e as crenças raciais eram manipuladas pelos sujeitos com a finalidade de monopolizar certas posições de prestígio. Os preconceitos raciais as demarcavam, aliado ao medo de perder o monopólio de posições favoráveis. Em 1965, na Inglaterra, John L. Scotson e Norbert Elias, examinando uma vila operária em que todos os habitantes tinham a mesma origem étnica e pertenciam à mesma classe social, verificaram que uma parte dos seus habitantes, os estabelecidos há mais tempo, se identificavam como diferentes, nutriam preconceitos, discriminavam e se distanciavam dos recém chegados, reivindicando para si um carisma de superioridade, a partir do desenvolvimento de grande coesão social e da atribuição aos forasteiros de vícios, defeitos e hábitos considerados inaceitáveis. Prescindiam da noção de raça.
Esses estudos empíricos demonstraram que preconceitos e discriminações eram usados em todos os casos para manter estabilizadas as relações de poder. Tática tão mais eficiente quanto fossem os preconceitos aceitos como naturais e reais pelos subalternos. Como resistir? Negando o carisma dos opressores, revertendo em carisma símbolos usados para a sua desgraça social? O chamado racismo reverso seria apenas uma arma de desestabilização da ordem racial opressiva e a negação contundente do racismo introjetado.
Seríamos prisioneiros do racismo, mesmo negando-o? Não para os interacionistas: agentes humanos podem encontrar saídas para dilemas lógicos.
Antonio Sérgio Alfredo Guimarães (@asagmrs). Titular USP (@usp.oficial) / Visitante UFBa (@ufbaempauta)
*Este post não representa necessariamente a posição da ANPOCS.